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Arbitragens nas sociedades empresariais
A afirmação acima até poderia causar estranheza, uma vez que a prática nos mostra a ampla inserção da arbitragem no seio das sociedades empresariais.
A arbitragem é hoje uma feliz realidade no Brasil e tem se mostrado como uma eficiente alternativa ao lento e custoso processo judicial. Contudo, a possibilidade de sua aplicação para a solução de conflitos societários ainda é alvo de reflexões.
A afirmação acima até poderia causar estranheza, uma vez que a prática nos mostra a ampla inserção da arbitragem no seio das sociedades empresariais. Tanto é assim que uma empresa não seria classificada como sendo do Novo Mercado, se não contivesse em seus estatutos uma cláusula arbitral.
Ademais, embora a jurisprudência não tenha se consolidado sobre o assunto, é possível encontrar decisões favoráveis ao emprego da arbitragem para dirimir pendências societárias: TJPR - Apelação 220697-3: A dissolução ou extinção de sociedade pode ser objeto de arbitragem. TJMG - Agravo de Instrumento nº 471.292-1: [...] pretendendo os Agravados dissolver parcialmente a sociedade, (...) deverão buscar dirimir a controvérsia na via arbitral, e não se valerem do Poder Judiciário para esse fim.
Apesar do panorama favorável, não se deve descuidar de algumas questões que poderiam ensejar dúvidas, como, por exemplo: os sócios que não tenham participado da decisão societária, que incluiu no pacto social uma cláusula de arbitragem, estariam vinculados à jurisdição arbitral? Poderiam eles se socorrer do judiciário?
Na hipótese de sócio ingressante em sociedade que já contenha cláusula arbitral em seus estatutos, o novo sócio passa a acolher o regimento como um todo, incluindo-se aí cláusula arbitral. Assim, mesmo que o novo sócio não tenha efetivamente participado da decisão que elegeu a via extrajudicial, ele aceita a determinação da sociedade quando integra seu quadro social, submetendo-se, desta forma, a todos os dispositivos estatutários.
Há, no entanto, quem entenda diferentemente, defendendo que o ingresso de novos sócios equivaleria à celebração de contrato por adesão, ficando, dessa forma, o sócio ingressante desvinculado da cláusula arbitral por força do art. 4º da Lei 9.307, de 1996. Se esse entendimento fosse acatado, o sócio ingressante poderia, em tese, socorrer-se do Poder Judiciário e desconsiderar o pacto de arbitragem.
Apesar da dúvida exposta acima, em nossa opinião, o contrato de adesão, conforme pensado pelo art. 4º da Lei 9.307, pressupõe uma desigualdade de forças e interesses oponíveis entre as partes. Assim é a relação entre o comprador de um veículo e a revendedora, em que o consumidor tem o interesse na aquisição do veículo e o fornecedor no recebimento do valor em pagamento. No caso das sociedades, o novo sócio não se encontra em posição de inferioridade em relação aos antigos, visto que ingressa consciente das qualificações da empresa. Mais ainda, a nova relação estabelecida não prevê interesses oponíveis, mas convergentes, uma vez que os sócios devem cooperar e trabalhar em conjunto para o bom desempenho da companhia. Portanto, o potencial novo sócio, antes de ingressar na sociedade, deve avaliar os regimentos empresariais, e ponderar sobre a conveniência de atrelar-se a uma sociedade que eleja foro arbitral em vez de foro judicial, pois ao ingressar estará imediatamente sujeito a todas as disposições estatutárias.
Além de se analisar o posicionamento do sócio ingressante, ainda se deve dar atenção ao sócio dissidente, ou seja, o sócio que discordou da deliberação corporativa que incluiu no estatuto ou contrato social uma cláusula arbitral. Deve o sócio dissidente submeter-se à nova cláusula? Teria o sócio direito de retirada?
A princípio, entende-se que o sócio dissidente deve submeter-se à nova determinação que incluiu a convenção arbitral. Afinal, trata-se de deliberação societária, fruto da vontade social, que não enseja perda de patrimônio nem tolhe dos sócios direitos essenciais.
Todavia, ao discordar da opção pela inclusão da cláusula, o sócio dissidente demonstra sentimento conflitante com um princípio básico que rege a arbitragem, qual seja, a vontade da parte em avençar convenção arbitral: se não há vontade expressa em arbitrar, não há que se falar em arbitragem.
Nesse caso, restaria ao sócio exercer o seu direito de recesso e pleitear a dissolução parcial da sociedade. Entretanto, o direito de recesso parece servir apenas às sociedades limitadas, pois o art. 1077 do Código Civil prevê a possibilidade de retirada de sócio em caso de modificação do contrato social, ao passo que lei das S.A. silencia sobre o assunto.
Dessa forma, enquanto a jurisprudência não se pronuncia a esse respeito, conservadoramente, pode-se interpretar que o direito de retirada é exclusividade das sociedades limitadas, não servindo ao regime das sociedades anônimas. Como se anteviu, cuida-se de questão ainda polêmica, mas que deve, em breve, alcançar uma definição, em razão do exponencial aumento do número de arbitragens no Brasil.
Ricardo Medina Salla é sócio do escritório Szazi Bechara Advogados
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