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Empresas apelam a importados e temem futuro

O faturamento com a produção local foi substituído pelos ganhos com os importados

Caso exemplar das adaptações na indústria do país, a Black&Decker, uma das principais empresas de eletrodomésticos de ferramentas no Brasil, prevê faturar US$ 470 milhões neste ano, quase 13% acima do faturamento em 2009 e bem além dos R$ 400 milhões de 2000. Mas vai exportar 20% a menos que no ano passado, produzirá 5,4 milhões de unidades, 400 mil a menos que em 2000, e passou a importar da Ásia produtos que fabricava localmente para venda no mercado interno brasileiro.

"O faturamento com a produção local foi substituído pelos ganhos com os importados", comenta o diretor de operações da Black & Decker, Domingos Dragone. Graças à barreira antidumping imposta a produtos da China, a empresa preservou a produção de ferro de passar, que vinha sendo reduzida "drasticamente" três anos atrás, mas produtos de menor saída, como faca elétrica e espremedor de fruta são 100% importados, diz ele. "Costumávamos fazer grill (tostadeira) aqui, hoje importamos tudo, 200 mil unidades por ano. Em ferramentas industriais, passamos a importar 65%, e algumas, como serra-mármore são totalmente importadas."

Dragone conta que já foi pior. Em 2007, a queda na competitividade em relação aos produtos chineses, mais baratos e subsidiados, quase levou ao abandono de linhas de produção inteiras. "Ainda fabricamos 60%, para 40% de importados. Essa relação já foi de 80% para 20% e caminhamos para 50% a 50% até o fim do ano", conta. O quadro de funcionários, 700 pessoas, é ligeiramente menor que os 800 de anos atrás, mas atividades antes terceirizadas, como usinagem de peças, agora são feitas na fábrica. Na prática, eliminaram-se 200 empregos na produção.

"Na indústria de máquinas e equipamentos há empresas que já tiveram 300 funcionários. Hoje têm 20, e o faturamento e rentabilidade triplicaram", diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimac), Luiz Aubert Neto. Ele comenta que os setores protegidos por tarifas de importação de 35% ainda mantêm percentual grande de produção local, como no caso do automotivo, mas, mesmo nesses casos, os fornecedores de partes e peças têm cedido à concorrência estrangeira. "Já não há praticamente produtora de autopeças de origem nacional. No setor aeronáutico, a Embraer tem engenharia própria, mas importa a maior parte dos componentes com tecnologia embarcada", diz, lembrando que o Brasil já foi o quinto maior fabricante mundial de máquinas e, hoje, é o 14º .

"Os equipamentos para Belo Monte serão todos importados, não temos preço para competir", comenta Humberto Barbato, da Abinee. "Em breve aparecerão, nas estatísticas, as importações de equipamentos, de negócios que a indústria nacional perdeu", prevê. A Abinee iniciou estudos para mostrar que, por baixo dos dados otimistas, há preocupantes indicadores negativos em setores importantes da indústria. "Há claramente um processo de desindustrialização acelerado", endossa o economista Márcio Holland, que coordenou estudos recentes da FGV sobre o tema.

Holland reconhece que a discussão do tema tornou-se um "quebra-cabeças" em que os dois lados do debate encontram "evidência empíricas" favoráveis e contrárias às suas teses, ao mesmo tempo. Na FGV, Régis Bonelli, que nega a desindustrialização, apresenta dados que, embora mostrem recuperação recente, apontam perda do peso da indústria em relação ao passado.

Na mesma FGV, Nélson Marconi e Fernando Barbi, que apontam indícios de desindustrialização, mostram gráficos que, ao mesmo tempo, revelam aumento da participação, no Produto Interno Bruto (PIB), de manufaturas de alta e média tecnologia.

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